ODE AOS LIVROS

Razia vida
sem mastigar
estilhas a curta existência
surtas viventes
meros transeuntes
em penitência
purgam seus
descuidosos momentos
eternos e passageiros.
Repito teu nome
vida
nestes versos
sinto em cada fôlego
tua repetição
submersa em surpresas.
Vida
ocupo-me de tuas horas
leio um entre tantos livros
espalhados nos aconchegos
da casa
eles rogam ansiosos
o afago de meus dedos
feito eu
eles também sofrem.
os livros querem existir
de verdade fora do papel
como alma que
vive fora do corpo.
ocupo-me do banho
batismo dos meus dias
ressurreição da poeta
olhos roxos na vigília
dos versos
coxos de saudades.

Em meus dias
desacorrentados
observo a pressa
a morosidade dos animais
sem pecado sem culpa
na fidelidade em desatino
no tino à própria natureza
quinhão de fardo e destino.

O tempo sem passividade
tudo aceita
insulto – o no escorrer
dos minutos
nas coisas bobas do dia
sem pesar
já tenho a idade
vejo a novela clichê repetida
adormeço
na cadeira de balanço
rancho que amamentou
e ninou meus filhos
posposta na varanda.

Nessa brevidade imagino
que a fruta doce na minha boca
ainda é semente à procura de chão
e tu meu amor
já estais lívido
e sem vida mesmo agora
quando toco teus cabelos
será que meu vestido
da infância aquele xadrez
com fitinhas marrons
voltou ao meu armário?
ou a caneta concreta
que seguro é a única certeza?

Dizem que o tempo
come nossas carnes
quero acreditar que sim
há pouco vi
mais fundo o meu olhar
mais baixas minhas pálpebras
mais calos no meu rosto ralo
vi mais saudade no espelho.

Eu queria fugir
para dentro dos livros
ser eterna em suas histórias
humilhar o tempo
que só nos dá incertezas.

6 comentários em “ODE AOS LIVROS

  1. À falta de comentários, surge o meu. A escrita desse poema deu-se quando eu, após a leitura do livro ‘ Sobre a Brevidade da Vida”, de Sêneca. Filósofo pré-socrático, freneticamente, questionei.seu sentido, quis dar sentido a cada momento. Os livros eram os Portais que me abriam esse caminho.

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  2. Jovina, quem criou a contagem do tempo no relógio não enxergava a poesia no tempo que passa no teu vestido xadrez de menina, nas tuas pálpebras que em tudo veem beleza. Na harmonia dos teus versos tem o registro da eternidade, carrega a alma para a posteridade.
    Destaco aqui um verso que me segurou:
    “os livros querem existir
    de verdade fora do papel
    como alma que
    vive fora do corpo.”
    Beijo minha poeta! ♥️

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    1. Elaine, muito obrigada. O fato de você ter gostado do meu poema me deixou muito, muito feliz, porque você é uma escritora e leitora ótima, atuante. Beijo

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