Rocambole, recheio de amor

A cozinha é o meu lugar sagrado de magia, lembranças e meu cômodo preferido da casa. E é desse lugar a lembrança mais nostálgica que carrego comigo. A lembrança do Rocambole de Goiabada que minha mãe fazia, nas raras vezes em que cozinhava.

A receita é simples: massa de pão de ló e goiabada cremosa. De tão simples nunca consegui reproduzir a contento, por mais que eu tente. O bolo sempre fica ruim e a sensação que falta algo, me deixa frustrada.

Para Mia Couto “cozinhar é um modo de amar os outros” e, eu acrescento que, amar é entregar-se por inteiro. Na cozinha, assim como no amor, não há espaço para a avareza. Basta ver o exemplo de uma mãe que alimenta cada filho com o mesmo tamanho de porção, nem que para isso ela abra mão da sua parte. Pura magia. Ela multiplica não o que sobra, mas o que falta.

Essa intensidade me faz pensar sobre o que aprendi com minha mãe e seu rocambole. Em primeiro lugar, o pão de ló deve ser assado em fogo médio, assim como o amor que deve crescer aos poucos, dia a dia. Depois de assado, deixe esfriar e só então, coloque sobre um pano úmido, salpicado de açúcar e aconchegante como colo de mãe. Em seguida, distribua a goiabada cremosa por toda a superfície do bolo, é doçura na medida certa e agrada a todos.

Agora, é só enrolar o pão de ló com a ajuda do pano açucarado, em volta dele mesmo, até se transformar em um rolo uniforme. Igual fazem as mães com os seus bebês recém-nascidos para que eles fiquem seguros e confortáveis. O bolo é frágil e qualquer pressão mais forte pode fazê-lo rachar. Feito isso, retire o pano, acomode o bolo em uma travessa e já pode fatiá-lo.

Ansiosa, não via a hora de ganhar o meu pedaço de bolo. Mamãe fazia questão que cada uma recebesse o mesmo tamanho de fatia. E assim, aquele bolo era repartido com igualdade. Por isso, hoje sei que as mães amam igual, não existe filho preferido, nós é que somos diferentes uns dos outros, e elas sabem disso, mas o amor é o mesmo.

E a frustração com a receita? Simples, não é que o bolo fique ruim, como disse, a receita é simples, fácil e qualquer pessoa faz. O ruim é a falta que sinto da pessoa que fazia o rocambole e distribuía porções exatas de amor.

Publicado por ceupassos

Escrevo e rabisco contos, crônicas e poemas. Faço colagens digitais e tudo mais que minha alma deseja e o corpo permite.

Um comentário em “Rocambole, recheio de amor

  1. Que receita de amor linda, Céu ♥️
    Uma crônica pra guardar no coração. Mãe é aquilo de mais único que temos na nossa vida, como se ela pudesse ser igual e ao mesmo tempo diferente para cada um dos filhos. Parabéns por esse texto emocionante.

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