NOVELA

Assistia todas as novelas, das duas, seis, sete, oito e qualquer outra reprise que pudesse passar entre esses horários.

Entre sonhos e panelas, desejos e afazeres, aquela vida encantada das novelas dividia sua mente entre os devaneios e a realidade, mais devaneios que realidade. Se imaginava a mocinha da trama das seis e num passe de mágica era a própria megera da novela das oito. As megeras têm seu charme, mas isso até o próximo capítulo, pois, no final queria ser a mocinha; Seus destinos são perfeitos, todo em prol a um destino de contos de fadas. Por vezes, se revoltava diante do sapato gasto e as roupas de todos os dias, nem as empregadas das novelas das sete repetiam figurinos, sempre tão coloridos e alegres. E tudo acabaria bem no final, com casamento e festa. Assim seria sua vida, por hora imaginava, mas cria piamente, seria um enredo perfeito do horário nobre.

Sofreu horas e horas a fio o triste destino do núcleo pobre, vítima de carrascos e injustiças. “Ah! Um dia o mocinho olhará para mim e só ele saberá meu real valor. Me levará para sua grande casa, com carrão e mordomo; e o esperarei com seu lindo vestido longo no topo de uma escadaria enorme.” Ensaiava mentalmente o que diria quando o protagonista se declarasse, diria palavras bonitas, nem sabia o significado de muitas delas, mas eram bonitas.

Um dia, como outro dia qualquer, acordou cedo, com a cara inchada, descabelada, insatisfeita com seu destino tão lento, dia de feira, a patroa queria que fosse cedo, não podia perder o melhor da feira. Arrastou as sandálias pelo asfalto com a cabeça nas nuvens. Entre pepinos e abobrinhas o moço era lindo, a voz que lhe cortejava para uma compra perfeita e lhe piscava-lhe um olho, todo galante. O coração lhe saltou à boca. Se deteve analisando as possibilidades. Virou-lhe as costas afinal, o mocinho não estava encerrado num cubo.


Crédito da Imagem: Foto por Gelatin em Pexels.com

Os textos representam a visão das respectivas autoras e não expressam a opinião do Sabático Literário.”

Publicado por Katja Mota

Não fui eu, foi o meu eu lírico.

4 comentários em “NOVELA

  1. Lembro da minha adolescência começava com malhação e terminava na novela das 20h que virou das 21h, passeando por outros canais e vendo as mexicanas. Hj vivemos a Era do streaming e das séries de todos os gostos. Muito bom!

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